22 de dezembro de 2009

Minha mãe a sonhar*

Tive um sonho. Estava numa colina, na qual via meus filhos, meus netos, meus pais, sogros. Então, também me via junto com meu companheiro. Na tranquilidade de minha maturidade via meus netos correndo, felizes, saudáveis. Pequenos instrumentos musicais compunham o cenário. Cantores mirins formavam um coral. Mais além, pequenas enxadas e ancinhos trabalhavam num pomar, outros num jardim. Toda esta paisagem formava um lindo arco-íris formado por todas as raças. E parecia um sonho dentro do meu sonho. O som da música, das pás, do serrote numa mini marcenaria formavam uma orquestra que tinha o amor como compasso principal, a solidariedade como tom maior, a igualdade como clave universal.

Virei-me bem devagar junto com meu companheiro e vimos os nossos e outros filhos com os olhos fixos nos seus e nos filhos de todos. Estavam felizes! Realizados emocional e profissionalmente. Lutavam por ser ainda melhores, mas não tinham a preocupação do desemprego, da fome, da miséria da ausência do lazer. O trabalho manual e intelectual se complementavam. Eram cidadãos de um país fantástico.

Então nossos olhos procuraram a sabedoria e encontramos os nossos e todos os mais velhos que nós. As lágrimas caíam mas nossos lábios sorriam. Víamos nosso futuro não tão distante e já não tínhamos medo!

Ao som do forró, da valsa, do bolero e do rock, casais se juntavam e, ritmados, aquela massa humana formou um corpo de baile belíssimo.

Subimos num pequeno morro. Nossas vistas alcançaram longe. Como num oceano, cabeleiras brancas, outras pintadas, imitavam as ondas no vai e vem do mar.

Fixamos nossa visão nos rostos. O tempo deixou-os com rugas, afora algumas plásticas. Eram as rugas da história de vida de cada um. Elas resumiram o conhecimento, a experiência, as dores e as alegrias do passado de cada um. Mas era a vida em sua plenitude. Viúvos e viúvas reencontrando o amor e carinho. Casais antigos revendo o passado, o momento atual de suas vidas e vendo a continuidade do futuro nas crianças.

Não havia angústia, medo ou solidão.
Não havia discriminação e isolamento
Havia consideração, respeito e muito amor.


*Escrito por Inês Albuquerque Pupo

15 de novembro de 2009

Pedras (preciosas) do caminho

Uma linha de ouro me envolve
de proteção e luz ela se faz
Lembrando-me de conexões antigas, tão minhas
De caminhos longos vividos, peregrinos espaciais,
aprendizes do futuro, sempre iluminado
tanto pela força do que será (o eterno destino),
quanto pela fé que se tem, pela crença que,
de tijolinho em tijolinho se constrói em nosso ser -
fortaleza essencial, essência moral pois que nos
alinhamos ao que somos - Eus Divinos.

Recuperemos, à serviço de trabalhos maiores,
nossas dignidades perdidas e um dia esquecidas
e largadas num canto qualquer. Retomemo-nas,
alinhando nossas mentes para não nos perdemos
na trilha dessa procura.

Viva nós,
Viva tudo.
Viva a vida e o mundo.

11 de novembro de 2009

Sopa das letrinhas

Minha fome de palavras
atravessa dicionários,
mas muito pouco se alimenta deles

Meio vazia de letras,
não é saciada nem com os mais exóticos alfabetos

Minhas frases trêmulas
não sentenciam-se
em métricas matemáticas
Elas nem sabem ao certo o que é uma gramática

Meus escritos alterados
partem dos garranchos sem pauta
marcam no papel idéias caóticas
E se alicerçam
como edifícios sujeitos a terremotos.... catastróficos.

2 de novembro de 2009

Em tempo

Tenho tudo o que quero,
Luz na cozinha, tantas presenças...
Ingredientes para a janta,
Seu tempero adocicado, mais acertado
Barriga satisfeita, o pensar correto

Duas mãos livres e inteiras,
Inteiramente livres
A vida pra viver o movimento
Sentir o espaço, fluir com o tempo

25 de outubro de 2009

Meus, tão eus meninos

Mas foi assim, deitei os olhos.

Fui lá no meu menino, longe pra ver como é que foi.
Naquilo que era o meu presente, eu, pela lente dele,
via claro, via nítido, via sim. Via o desenrolar do rolo velado.

Naquele momento ali, passado era presente no futuro.
Então ao menino representeei. À mim, me recoloquei.

Ao menino então lancei: “Ei, menino, caminhe à frente” –
como num espelho, eu caminho cá tu caminha rente.
Nas costas dum espelho espelhado tu caminha cá, eu caminho rente.

Ninguém sabe ninguém nunca viu, qualé que é eu, qualé que é tu.
No passado tu - tá presente eu, no futuro eu - tá presente tu.

Qualquer é tu, qualquer sou eu. No tracejado reto
do plano espelhado, qualquer imagem é objeto, de qualquer
jeito eu sou tu e tu sou eu.

17 de outubro de 2009

Pintura de parede

Já eu, não. Queria é ter uma casa de papel de algodão.
Aí eu pudesse, por todos os pontos seus poros
aquarelar de cor tinta azul, a parede como o teto anil do céu

Então eu mesmo pintaria toda gaivota bonita
voando com o sopro do vento na aba do chapéu

Aquarelar
Aqua rega escorrega
passarela de tinta
espraiando pelo ar...

15 de outubro de 2009

Desta criança que se fala

Deixo minha vida com ela:
mais sagaz e esperta,
essa minha criança paralela...

Vem comigo às vezes antes,
deveras mais adiante.

Meu destino é chegar nela
o dela é pegar em minha mão
com a sua pequenina e me guiar
pelos cantos bonitos, me mostrar
preciosidades quase escondidas pelo chão

somos como duas retas,
hoje ladeadas,
em breve bem coladas.

farei dela um bocado mais eu
farei, deste eu, um capricho da vida bela.

10 de outubro de 2009

Veio do Rio

Ah, rio de dentro
em mim desde a criação

Ah, rio de dentro
faz de mim teu eterno leito

Ah, rio de dentro
entrega-me em tua mansidão

Ah, rio de dentro
mata minha sede quando atravesso o sertão

Ah rio de dentro
corro com teus cascalhos,
rolo-me em teus seixos
e espraia-me nas areias finas...

Destino azul marinho,
viver tua imensidão...

4 de outubro de 2009

Carta à minha mãe

Aos teus 59 aninhos, um presente com muito carinho. Pras experiências novas que muito vão surgir, todas vivências que tiver pelas bandas de Gonçalves, terra mineira das Minas Gerais.

O livro "Manual do Arquiteto Descalço" lembra-me das discussões que faço em meu trabalho, sobre o conhecimento técnico e o tácito, esse que trazemos em nosso ser. Ele serve então pros arquitetos de diploma, mas também para os de coração. Comprei pra ti então, pois sei que minha mamãe tem em seu jeito alvoroçado um olhar todo especial, arquitetônico, empreendedor, construtor: de faces planas, de copa espaçosa pras refeições bem repostas, janelas claras pras almas iluminadas, de lares bem servidos pra vida bem vivida.

Você, mãe querida, é arquiteta dos sonhos mais bonitos.

E não se esqueça, jamais, de quem você é e de toda sua essência. Que é sabendo quem fomos que construimos quem seremos.
A toda hora, a todo instante.

Saiba que o esquecimento (que é sempre temporário) não desfaz o humano em nós, que nem toda amargura do mundo é capaz de abalar a poesia do viver.
Lembra-te de que toda e qualquer violência que nos agride, apesar de nos apertar o coração, é insignificante diante da beleza e da força da vida.

Tenhamos olhos de ver para além do imediato, de sentir mais adiante do que o tato.
Pois que que mesmo de sapatos, na verdade caminhamos descalços;
Que a poesia se destila, ainda quando estamos angustiados;
Que vivemos sempre nus, ainda que vestidos, de casacos;
De que tudo é dito, até quando permaneçemos calados;
Que o mundo gira, apesar de às vezes ficarmos parados.

Seja tu minha mãe. Arregace as mangas da tristeza e recolha energia de tua fonte mais verdadeira: a da alegria, que tanto te compõe. Permita o aprendizado da vida, não o revogue. É deste aprendizado que sobrevirá a nova qualidade a ser vivida.

Confie em ti. Sempre.
Afinal, todo dia é dia de se fazer destino.

Com muito amor e emoção
do seu filho que te ama,
Marcelo.

22 de setembro de 2009

Fragmentos II

Eu sei que um dia devagarinho, eu partiria. Não caminho sozinho tampouco de mala vazia. Pras acontecências da vida no dia deixaria um pensamento taciturno, um sorriso e votos de alegria. A tristeza não desapareceria. Ainda assim devo saber que partiria...

Sempre partimos, nem sempre juntos. Caminharíamos rente ao muro com pensamentos fiéis, feito os cães malhados branco e preto escuro. Tão pouco compreenderia, mas quem saberia o rumo certo de se aprender sem receio do desconhecido, carregado e inteiro naquilo sabido?

Tinha tantos sonhos, daquela vez não sumiriam, hoje bem seguros no bornal:
- cultivo-os em crença fértil, terra que se recupera, ligeira, sedenta, saciada como quem rega na despeja d'água!

Nem todos os referendos me fariam desistir. Não é disso que se trata, também não é certeza exata, mais prum suspiro de ar
rarefeito de peso, abundante de entrega. Salientes calos na boca me fizeram pensar, calar.

"Dobre sua lingua seu moço, já é temporada... trate de arriar os anseios, botá fermento, pelejá. Ceis não sabe mais comé, talvez um dia... Será que nunca souberam? Nessas histórias, a vida é viajar, usar o corpo santo, santificar? A vida é volta, sem pestanejar. O sertanejo é viajeiro sem destino, nas trilhas vai tudo caminhar. Mesmo nos caminhos que nunca ouviu falar... ou que tanto ouviu, e nunca fez sinal de ir lá.. pastar..."

Jogo é fogo, queimar os lentes... Aach, desgraçou o grupo. Lei rechaçou.

Caminhante grande esse, sujeito e chão, sujeito e sua mão. Mão pra expiar, expurgar tudo de mal, que um dia quis acrescentar:
No coitado do coração...

"O ruim, o duro da vida? É da gente!"

21 de setembro de 2009

Brasília, mais dias de agosto.

A vida inteira
passei me apurando
correndo todo apressado
punha o corpo onde não cabia
queria estar onde não havia
deixar a mente onde não devia

Agora que o dia se aclara
Eu, devagarinho,
vou descobrindo as intempéries do ser

A vida todinha
inventei de cobrar
cada centavinho
que pudesse tirar
A culpa caxia convidei como inquilina
Servindo-me de longe a comida fria

Vendo de Brasília
parece que as coisas estão mais claras
Céu aberto enxergo mais adiante

A Terra sempre é quem gira
e o Sol no poente
é miragem do nascente
E o Sol nascente
É a vista mais certa
de certo toda eterna
De nossas coisas vivas
que vivem pra sempre.

19 de setembro de 2009

Brasília, três de agosto.

Sei que a dor do meu choro
ainda é, e sempre foi,
expressão de minhas identidades
e as essências que delas
surgem e se constroem
ao longo da existência.

Por isso esse choro é belo,
é triste, é inteiro e pela metade
é íntegro e descabido;
Sério e maltrapilho,
horrendo martírio,
Caloroso, emboscado e sublime.

Ele me carrega em tua emoção
e ao permiti-la, experimento o
gosto forte da transcendência.

8 de setembro de 2009

Digo, digo sim












"Cabeça de Mulata"
Di Cavalcanti
(livre versão)

Um dia escrevo sobre você
Tua pele negra nunca vista
Plena de leve suavidade
Tuas feições risonhas
Boca felicitando
A fronha do travesseiro
Enganam-me as aparências
Malícia ingênua...
Feitura de menina madura

E teu semblante
Recria-me o mental
Impressionante como a luz revela
Tua bondade abissal
E desfaz em mim
Qualquer fúria animal
Impressinante como ela
Destranca minhas almas
De todo cárcere privado
Por mim um dia recriado...
Mas hoje desfeito
Pela simplicidade meiga
Do ar que te envolve
Dessa luz gentil que te recobre

Ah, vida infinita
Permita que esse prazer
Mais vezes se repita
Diga, vida... diga sim!
Pois que um dia
Destes sem hora e sem fim
Eu ainda escreverei
Sobre esta que me aparece,
mimosa e bela querubim...

2 de setembro de 2009

Sem Título

Um ésse que seja
quero acrescentar
pra não escassear
a pluralidade
das altas certezas

Um erre vou riscar
pra fazer valer
a virtude de se escrever
que não carece letra
pra ver fundo os teus olhos,
sair e transcender

Nem um é vou esquecer
pra continuar viscejando
o fluxo de versos frases
ditas em leve afirmativa..é...

Acentuarei mesmo sem grifo
mesmo sem gramática
a leitura é fantástica
pois que faz som agudo
caracteriza teus sinais
craseia de surpresa
faz com que meus ouvidos se mexa
um trocadilho com ameixa
faz com que meu medo, trema.

Vou perdurar os verbos
carregá-los para sempre
basta que tu se comunique
sem qualquer diminutivo
expressões itinerantes
remetidas no infinitivo.

flexionarei o tempo todo
farei mistura o dia inteiro
preterirei o erro que se foi
presentificarei o que seria do futuro
Se perfeito não é o passado
Faremos perfeição do imperfeito
Desconjugaremos a ausência
autografaremos a viva e bela presença.

Redijo milhares de sentenças
atinjo pautas mais altas
inverto parágrafos inteiros
sujeito-me às tuas lições
Pra que minha ortografia
carregue na pena do dia
a expressão viva da alegria

1 de setembro de 2009

Fragmentos

...E até os robôs, livres da desumanidade,
entoarão os cantos de liberdade,
farão das preces sua memória de futuro
romperão de suas placas e parafusos
a pulsação constante de um amor profundo
Mostrarão para o mundo
a possibilidade, ante os mais duros,
da lata fria tornar-se menos rude,
da alma fria renovar-se, amiúde.
Renovar-se, amiúde...

30 de agosto de 2009

Continuidade das histórias de meu pai*

Banana tem caroço,
seo moço?
Não seu lente,
banana tem semente!
Se banana tivesse caroço,
seria o maior alvoroço!
Imagine seu lente,
um demente:
Não saberia se,
comeria semente
e plantaria o caroço!
Ou, se, comeria o caroço
e semearia a semente!
Seo lente,
parece que até aqui
todo mundo mente!
Pois bananeira não nasce
nem do caroço e nem da semente!
E, como bananeira só dá um cacho,
para todo mundo ficar contente, seo lente,
é melhor acabar esse papo. Eu acho!

*Escrito pelo meu pai Fernando Pupo, ao buscar se lembrar de poema que seu pai recitava...

Lata velha

O espelho era de prata
- procurava a exata reflexão
A espada era de aço
- queria firme adesão
A mesa era de ferro
- apoiava-se sem descontração
O peito era de chumbo
- protegia-se da possível radiação
A caneta de ouro, o piso de mármore, o sapato de couro...

Mas perdido em si,
não observa
a grave distorção...
Não vê a curva da luz,
não sente o cheiro das rosas
nem a graça da diferença
Recrudesce na distância do ser.

E apesar de toda prata,
de todo ferro, aço
chumbo e ouro, da força
do mármore e do couro,
a natureza não o é.

A alma trancada
lata
O coração represo
pedra
O Amor de mentira
papel

Banha-se de medo,
Vestindo-se de guerra
E a vida passa, na
velocidade da carne
que estraga numa geladeira.

28 de agosto de 2009

diga, poesia

Se dissesse
Tanto mais acesso à poesia
quanto acesa a luz do dia

Eu sinto
Assim que ela permaneça clara
Como bela se faça estrela d'alva

Me pinta
Sem gasto de uso nem avaria
Que carregue dela a maestria

Tu diga
Ainda ela repousa calma
Que por dentro se fez alta

Se dissesse tanto quanto
Eu sinto assim como
Me pinta sem que
Tu diga, eu, ainda assim,
Pra poesia ecoaria,
Num dia de prata, um silvo na pradaria.

23 de agosto de 2009

As estrelas das Plêiades

Como inspiração deste dia, tivemos todos bons guias. O que aqui se esquadrinha é festa comemoração, florais de toda alegria: aos 10 anos dos florais das Plêiades.

Um abraço de gente miúda
pequena grandeza de ser
altiva esperança em muda
brota do chão raiz faz crescer
Em mim ramos e folhas
meu coração madrigal
borboletas de asas roxas
fazendo festa no quintal

Lápis preto
risco grosso
pele preta
galope forte
patas velozes
sons agudos
toque nas cordas
como esvoaçam minhas crinas
meu longo braço
barulho de casco
palitó ao alto
Relincho para as estrelas
castanholo pro céu
o repique do meu cavalo
e lá se vai meu chapéu...

Plasmo a corda duma proa
Priorizo o contraste, suave
não penso em luz, sem sombra
navego confiante
bússola aponta pro distante
brisa leve me alegra
maresia do oceano me agrega
velha barba branca, sal marinho
faço em águas claras longo caminho

22 de agosto de 2009

Algo soa-me familiar

A vida com seus mistérios
Vai caminhar
Tristeza tanta de chorar
Não haverá

Vamos todos passear
Vamos comungar
A paz que vai chegar
Viver o mundo novo
Que já está em teu olhar
As flores de Ipê, que do caminho que nos liga a Gonçalves se vê. Viva essas meninas, lá das bandas de Minas.

21 de agosto de 2009

pras alteza

Queria agradecer
de coração
Às vezes não sei o que
Não por falta do que dizer,
(dariam livros se assim permitir)
Mas por falta de como chegar
Aí no alto pra ti lhe pedir
Uma brechinha d'ouvido
E lhe sussurar: "obrigado sinhô"

Não sou anjo caído,
Mas lá no alto não posso me pôr
Persisto então daqui de baixo, com todo afinco
Fecho meus olhos e pela mente imagino
Um abraço gostoso, donde sua quentura e seu calor
Fazem de mim um eterno e agradecido menino.

19 de agosto de 2009

Epifaniando

Entra Caruaru
Som contido
Som pra tudo
Cutuca tu
Cutuca ti
Faz bambu

Não falta pra sol
Uma nota si ré
Flauta em mi m
Fá-flauta em nó ta
Flauta sim
Flautim vai lá
Homenagiá
Caruaru Matuá

18 de agosto de 2009

Verdade do dia

Antes de vir eu já sabia
Ele me colocaria
Onde não faltaria
Nem por um dia
Um bocado de alegria

Então me diria:
Vai menino, fazer sua folia!

13 de agosto de 2009

Descabido

Tenho de medo de mulher
Como tenho da vida.
Se me lançasse sem tê-los,
As amaria de forma descabida?

10 de agosto de 2009

Das flores que brotam do asfalto

Uma criança brotou hoje.
O mundo apressado, solto, rápido, corrente...
E uma criança brotou hoje
De sua barriga-botão saiu lindo, como toda força nascente

Uma criança respirou hoje
As calçadas fervilhantes sapatos sem parar,
E ele, ainda de pálpebras cerradas
Não vê a sujeira das ruas, mas sente.
Berra ainda a pleno e prematuro pulmão,
Mas tua inspiração já lhe acena
Que de tuas mãos haverão de nascer broto-sementes
De compreensão, de festa, da alegria forte do coração
Da dança, do sorriso, da paz que persevera, paciente

Uma criança brotou hoje
E se por acaso tocares nela,
Se por acaso tiveres esta alegria,
Se tu não receares, nem por um instante,
E tocares através de seu peito o coração
Inundaria-o a força fresca de uma esperança - Ah criança quente!
Quente como é quente, como é o alimento-sol da flor
Da flor-criança-botão que brotou hoje e que é,
Afinal de contas e acima de tudo... gente, humana gente!

Ao querido Joaquim, que nasceu de carreirinha nos números: às seis, dia sete, mês oito, ano nove.

9 de agosto de 2009

Vou ali, tá?

Volitar é um caminhar cantado
Deslize solfejado duma voz que vem d'alma
Me ajeito de todo traquejo, dispo de tudo meus pés

Volitar é um andar sublime
Muito se aparenta distante do solo um desligue
Mas se confunda não, pois que só com as aparência muito não se alcança

Que esse tal de volitar carece pelo miolo da Terra se aterrar
E para o céu admirá e de estrelas se banhá, toda ternura...
E deixar crescer os calor do peito
Alumiá a luz de um cristo engrandecedor

Espalhar as asas, um passarinho, me esvoaçar
Uma vontade sincera, adejada pelo ar
Uma vontade sincera, adejada pelo ar...

20 de julho de 2009

Aldeia Belém

Pois eu?
Vim pra São Félix do Araguaia
paquerar as aldeias...
pular, correr, viver nas brincadeiras
sorriso de cara pro mais adiante
Ao que virá, tenho uma criança latente.

A warã é roda de estrela Xavante

Enquanto na aldeia forte foram meus olhos, semi-analfabetos...
mas se fechasse-os, veria eu vivido em sonho
sonho Xavante, feito os feitos em roda de constelação anciã.

Teria dançado no centro da aldeia?
Margaridas em pétalas rodantes
mandala em feitura circulante
Eu feito todinho de corpo magnético ondulante
marcando o passo no chão, estridente.
Vejo o céu da noite tingido verdejantes
Inunda-me uma beleza terrena, altivante.

Sento-me no chão, paciente
apoiando-me no mundo, confiante.
E as estrelas, eternas parceiras cintilantes
ao despencarem das alturas
nos ofertam diária e cadentemente
sonhos, força e luz. Radiantes.

Agradeço, novamente,
à aldeia Belém e à todo povo Xavante.

12 de julho de 2009

Samba de Irmão

Que o Samba do Irmão
cante mais alto, aquecendo o coração
Que a vida eterna preencha qualquer vazio da alma
e a força da alegria, no cotidiano de nosso viver,
faça das trevas uma fina linha
abrindo espaço para o que há de novo,
despertar para outras tantas alvoradas.

Não cristalizemos a sombra da noite,
façamos dela festa de São João,
permitindo que à luz das estrelas
sobrevenha o raiar de novos dias.

Às mudanças que virão,
com carinho de uma estrela guia.
Dedicado a Sérgio e Fernando Vaz Pupo,
sobre música de Martinho da Vila

3 de julho de 2009

Mundo que Muta

E há mais?
Há mais o que ver, sem pestanejar
Não duvide, tudo vai desaguar
Seja sincero, e por acaso nunca duvidaste
da terra, da crosta ao marinheiro expiar
Saia de casa invade o Sol, retrucam os poros
Pessoas são vestes a sacolejar
por dentro almas contidas
esperando suturas a se formar
No oceano da vida todos desaguar
"Abram-se as comportas", esse dia vai chegar
E ninguém, nenhum alguém vai duvidar
Toda sugestão que um dia já chegou
vão se revelar, e todos com Deus irão comemorar
Abram alas! o mundo quer passar!

Ocê pontua com quê?

Não receie. Relaxe.
Pra tudo no seu tempo, vamos sim caminhar.
Tu tem pressa é de que? comer? comer?
Já sabes que tá tudo ligado
os canais uns nos outros, liga aqui dá ali
Entonces mi fio, querdita sim, querdita mais.
Xacaia tudo, desprende os frutos cegos
desapercebido preso nos gaio, segurá pra que?
Ah, deixa pros pássaro comer,
eles sim sabe comé o certo, na hora certa.
Ocê vai fazer o que tem no coração,
afine a escuta, sintonize no canal certo: ocê.com.ocê
É pra esparramar tudo mermo.

Jotinha disse uma vez:

E pra continuar
tem que dar linha pro ar
pipa solta no espaço clássico
bate brisa, bate o coração no olhar
brotam rosas, acolhem-se pétalas
deixe tudo como está
girando como um peão
multi-colorido sobre um certo chão
ponta-cabeça e lá vai ele disco-flutuar
gira eixo, gira mundo girassol
todo alienígena sobre as flores vem pousar
E tu, vem de onde?
Eu venho da casa da coragem
Por todos os mares, desde sempre, vou navegar.
No peito de uma criança, sem medo a respirar.

Ao João Rio, com carinho.

Houvesse quem Visse

Na confusão
também há poesia...
Também a poesia
se esguia, toda
parece linguiça, se estica
pra mor de não ser mordida
E que seje!
não seria ela muito robusta, mesmo que digesta?
Mesmo que digesta, partida, estrofulada
e toda versificada...
Não permaneceria ela, aparentemente confusa
mas porém fervorosa e augusta?
Poesia? diria meu pai: coisa estranha.
Mexida, inxirida, carcomida
e ainda assim, carregada de rima?
e mais ainda, cheia de vida?

Ondéquiocêfoiachá?

Ocê sabe onde tá a vida, seu moço?
E ocê moça, ocê sabe onde tá a vida?

Às veis ela me conta
é, ela me conta, mas só as veis...

Ela me conta que a vida tá
no quintal que a gente a caminha,
pelo mundarel de gente na avenida
Nas moléculas que se organiza,
por dentro a me transformar
No gato que ronrona,
na galinha que cacareja
Nas mãos que me toca...

A vida tá nos zoio, ocê entende?

Onde está a vida menino? ela me pergunta...
e por mais que eu feche os olhos num tem jeito de não escutar...

A vida tá no carrossel que gira
nos planeta lá do céu que orbita
na esquina do encontro
na frase mal dita
na refeição reposta
nas respostas atravessada
num grito do alto de uma montanha...

Onde tá a vida, seu moço,
senão em nosso oiá?

3 de junho de 2009

Zen remuneração

Assim, assim
sempre ouvi dizer
que na estrada sempre tem aforismos...

que nas entradas fazem-se vidas
que as enxadas fazem-se vivas
quando se tenta curtir o campo

que de olhos fechados faço o mundo
do jeito que ouvi dizer que era
do mesmo sempre que a grande eternidade prometeu
quem foi Ptolomeu? quem foi Isaías?

não estou de saída
o caminho mais longo é minha via
estreita porém carregada de beleza
cheia, porém no mar tem água salgada que banha a baleia
destreza no meu calcanhar que pisa onde finda o mundo
mas só quando fecho meus olhos...

descubro que mesmo cerrado me faço de olhares
pra espaços que vão pra além de minhas imagens
restritas de materialidades objetivas
mas se conjugo em outros tempos
impossível passa a ser subjulgar o mundo
esse que caminho, ao menos... e há tantos mais...
menos é mais
mais não é menos
nada há de ser feito "mais ou menos"
caminhemos,
caminhemos,
caminhemos. Em tu.

A dios, Sai Baba

1 de junho de 2009

Tempo II

(...)
Ninguém sabe o que será
Do tempo futuramente
Mas o tempo do presente
Tudo tem e tudo dá
O que tem no tempo está
Em um caderno anotado
Tudo o que o tempo tem dado
De tempo em tempo se soma
Que o tempo com tempo toma
Tudo o que deu no passado

O tempo não tem feição
Não tem cheiro, não tem cor
Não tem som, não tem sabor
Voa sem ser avião
Rouba mas não é ladrão
Carrega tudo o que cria
Tempo é vento que assovia
Que passa e faz piruêta
E o vivente é borboleta
Levada na ventania
(...)

Siba

Ao vê-la

Ao ver uma criança
Singela flor que se revela
Pense leve, doce ternura

Ao ver uma criança
Nosso banho de esperança
não tome tempo, ascenda sempre

Para o broto das infâncias
muita terra a revestir suas raízes

Ao ver uma criança
Imagine-a vestida, muitas luzes,
intencione sonhos e desejos das mais belas matizes.

A música a me acompanhar

Ver o sorriso de uma criança
É o batismo de esperança
No despertar dessa infância

Ver o batismo dessa criança
É o despertar de uma esperança
No sorriso da infância

21 de maio de 2009

Ao que seria o Nada, ao que diriam Irreal

Sons que não vejo
Imagens que não acaricio...
Um mundo que não é meu?
Pois não desejo possuí-lo, afinal
quem teria o cheiro e o tempero do imaterial?

Eu mergulhado dos pés a cabeça
afinado de sintonia, preenchida frequência universo sideral.

O que se faz de consciência?
Do sublime um concreto pensamento
ao que tudo indica menos denso que a finura dum papel.

Aos objetos não inspirados;
aos odores que não se degustam;
às ausências humano-corporais;
ao sentimento que se emana:

Endereço um olhar longevo
e a completude irrestrita de meu toque;
Ofereço meu cego paladar
uma tênue e perene vibração.

Dedico a certidão de uma palavra incabível,
e o clamor ilógico de uma razoável esperança.

Tudo Começou

A questão toda é o tempo
quanto tempo tenho,
faz será sentido uma pergunta assim?
o tempo das palavras colocadas
alinhadas fazem da frase balcão de botiquim?
nunca se sabe, nunca se viu,
porém quem conceberia
o tempo na forma de um fio?